O juiz de Direito da Vara Criminal de Conceição do Coité, Gerivaldo Alves Neiva, voltou a movimentar o meio jurídico e as redes sociais após uma decisão tomada durante uma audiência de custódia que ocorreu nesta quarta-feira (15).
Gerivaldo Neiva
Segundo relato publicado pelo próprio magistrado, o caso envolveu um homem de 45 anos, pedreiro, suspeito de ameaça e tráfico de drogas. O juiz, após debater o caso com o promotor de Justiça e o defensor público, decidiu relaxar o flagrante por considerar que houve violação ao domicílio do suspeito sem mandado judicial e sem evidências de crime em andamento.
“O flagranteado é pedreiro, 45 anos de idade, residência fixa e sem antecedentes. A história: uma vizinha, por desentendimento em relação a um corredor entre sua residência e o flagranteado, registrou boletim de ocorrência alegando ameaça e que o vizinho cultivava pés de maconha na laje de sua casa”, relatou Neiva.
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De acordo com o juiz, policiais foram ao local, confirmaram a existência das plantas e prenderam o homem após arrancarem os vasos com os pés de maconha.
Durante o depoimento, o suspeito afirmou:
“Doutor, eu sou pedreiro (mostrando as mãos calejadas), uso maconha desde os 16 anos e, quando soube que estava liberado para uso próprio, resolvi cultivar para não ter que ir nas ‘bicas’ comprar. Já tem uns quatro meses que cultivo”, disse.
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Diante do contexto, o magistrado decidiu relaxar o flagrante, destacando o princípio constitucional da inviolabilidade do domicílio:
“Evidente que relaxei o flagrante por violação ao princípio da inviolabilidade do domicílio, sem evidências de crime ou mandado judicial, sem adentrar no mérito da legalidade do cultivo”, explicou.
Em tom descontraído, Neiva contou ainda uma observação feita por sua estagiária ao final da audiência:
“No final, minha estagiária perguntou por que não determinei a restituição das plantas. Respondi: ‘As coitadas foram mortas sem culpa, já estão murchas e não servem mais pra nada’.”
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Histórico de decisões polêmicas
Essa não é a primeira vez que o juiz toma uma decisão que desperta atenção. Em 2008, Neiva ganhou projeção nacional após uma sentença que ele próprio intitulou “A crônica de um crime anunciado”, na qual condenou um acusado de furto a procurar emprego, em vez de aplicar pena privativa de liberdade.
Dezesseis anos depois, a jornalista Rafaela Rodrigues entrevistou o homem que foi beneficiado por aquela decisão. Hoje, ele afirma através da língua de sinais (libras) que a sentença mudou sua vida: conseguiu emprego e nunca mais se envolveu com a Justiça.
Questionamentos da jornalista Rafaela Rodrigues
Em entrevista à jornalista Rafaela Rodrigues, o magistrado esclareceu que a decisão se deu em razão da entrada irregular na residência do suspeito, sem a devida autorização judicial. Segundo ele, a Constituição garante a inviolabilidade do domicílio, e somente em situações de flagrante devidamente configuradas é possível o ingresso sem mandado.
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“Na audiência de custódia, o juiz pode relaxar o flagrante, deferir a liberdade provisória ou converter o flagrante em prisão preventiva. Neste caso, por considerar irregular o flagrante, o juiz optou pela primeira hipótese, ou seja, relaxar o flagrante. Tudo dentro da Lei”, informou a repórter.
Questionado sobre eventuais críticas da opinião pública, o magistrado afirmou que o papel do juiz é aplicar a lei, independentemente de pressões externas ou repercussões sociais.
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“Um juiz não pode decidir pensando no que a opinião pública vai comentar, mas decidir de acordo com a lei. O papel do juiz é cumprir a lei e as decisões dos Tribunais Superiores. No Brasil, o STF já decidiu a possibilidade do porte de pequena quantidade de maconha para consumo pessoal, bem como a possibilidade de cultivo de 06 plantas fêmeas”, reforçou.
O magistrado também negou que a ideia de que sua decisão possa incentivar o cultivo doméstico da planta e citou uma decisão do Supremo Tribunal Federal.
“Se o Supremo Tribunal Federal garantiu aos usuários que pode portar pequena quantidade (até 40 gramas) para seu consumo pessoal ou ter plantas em casa, um juiz não pode decidir contra essa orientação”, finaliza.
Confira a reportagem relacionada sobre o tema: https://noticias.stf.jus.br/postsnoticias/stf-define-40-gramas-de-maconha-como-criterio-para-diferenciar-usuario-de-traficante/
Redação